Rafaela Costa é acusada de envolvimento na morte do marido, Igor Peretto, em Praia Grande (SP). Itens buscados por ela após o crime constam em relatório complementar de investigação da Polícia Civil.
Viúva Rafaela Costa fez diversas pesquisas após a morte do marido Igor Peretto — Foto: Reprodução e Arte/g1 Santos
A viúva Rafaela Costa fez uma série de pesquisas na internet após o assassinato do marido, Igor Peretto, em Praia Grande, no litoral de São Paulo. Em acesso às buscas, que vão desde “quanto tempo o corpo começa a feder?” até “como privar o inst [Instagram]”. As informações constam em um relatório complementar de investigação da Polícia Civil, que foi enviado à Justiça.
Rafaela e mais duas pessoas próximas a Igor foram presas pelo crime: Marcelly Peretto (irmã) e Mario Vitorino (cunhado e sócio). O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) concluiu que o trio premeditou a morte do comerciante, em 31 de agosto, porque ele era um “empecilho no triângulo amoroso”.
Conforme registrado no relatório da Polícia Civil obtido, Rafaela usou o celular para fazer pesquisas, entrar no Instagram e procurar destinos em um aplicativo de sistema de posicionamento global, conhecido pela sigla GPS [em inglês, Global Positioning System] após o crime.
Por volta das 9h do dia do assassinato de Igor, ela pesquisou “quanto tempo o corpo começa a feder?“, uma busca considerada “chocante” pela corporação. Mais tarde, Rafaela procurou como deixar a conta do Instagram privada para que somente pessoas autorizadas tivessem acesso ao perfil.
“Em busca de fama e seguidores, Rafaela possuía a rede social Instagram ‘aberta'”, afirmou a polícia, ainda no documento. “Após o crime, ela também busca pelo anonimato”, acrescentou a corporação.
A Polícia Civil constatou diversos acessos dela na rede social, mas nenhum conteúdo foi recuperado. A corporação afirmou que Rafaela teria apagado dados do próprio celular.
Em 6 de setembro, dia em que a mulher se entregou à polícia e foi presa, ela pesquisou três vezes o próprio nome. As buscas foram realizadas às 14h23m27s, 14h23m28s e 14h25m06s.
Aplicativo de GPS
De acordo com a Polícia Civil, Rafaela iniciou uma busca por diferentes destinos, minutos depois de desligar uma ligação com o celular de Igor quando o homem já estava “morto ou agonizando”. A corporação afirmou que o objetivo dela era fugir.
Entre os locais pesquisados pela viúva, estavam Chã Grande (PE), cidade em que ela nasceu, e o município de Pindamonhangaba (SP), onde se hospedou em um motel com Mario e abandonou um carro depois do assassinato.
Rafaela Costa e Igor Peretto (à esq). Viúva chegando na DIG em Praia Grande (SP) (à dir.). — Foto: Reprodução/Redes Sociais e Matheus Croce/TV Tribuna
Confira o histórico de pesquisas de Rafaela Costa em ordem cronológica:
31/08/2024, dia do assassinato de Igor Peretto.
06:18:42 – São Paulo;
06:51:57 – Minas Gerais;
06:52:05 – Minas Gerais;
06:55:18 – Rio de Janeiro;
08:07:53 – Campos do Jordão (SP);
08:49:08 – Posto de combustíveis em Caçapava (SP);
08:49:17 – Posto de combustíveis em Caçapava (SP);
09:44:43 – quanto tempo o corpo começa a feder;
09:44:44 – quanto tempo o corpo começa a feder;
11:18:28 – Chã Grande (PE), cidade que Rafaela nasceu;
11:32:51 – Motel em Pindamonhangaba (SP), onde a mulher se hospedou com Mario;
12:52:02 – como privar o inst;
12:52:02 – como privar o inst;
12:52:43 – como colocar a conta do meu inst para uma conta pessoal;
12:52:43 – como colocar a conta do meu inst para uma conta pessoal;
15:07:08 – Bahia;
15:07:32 – Salvador (BA);
15:38:29 – Rodoviária;
15:39:45 – Motel em Taubaté (SP);
15:41:06 – Terminal Rodoviário de Passageiros;
15:52:23 – Um outro motel em Pindamonhangaba.
06/09/2024, dia em que Rafaela se entregou à polícia e foi presa.
14:23:27 – rafaela costa
14:23:28 – rafaela costa
14:25:06 – rafaela costa
Defesa
O advogado da viúva, Marcelo Cruz, informou que restabelecerá as conversas que a polícia alegou terem sido apagadas do celular. De acordo com ele, o objetivo será demonstrar que Rafaela não premeditou ou planejou a morte do marido.
“Ressalto que a prova com campo do direito penal deve ser analisada como um todo, jamais isoladamente, pois, caso contrário, pode ser interpretada equivocadamente”, ressaltou Cruz.
Últimas palavras
As últimas palavras de Igor Peretto foram descritas por testemunhas ouvidas pela Polícia Civil. Os relatos constam em um inquérito da corporação e em uma denúncia do Ministério Público de São Paulo (MP-SP).
De acordo com as testemunhas, Igor declarou amor pela esposa, Rafaela Costa, minutos antes de ser morto a facadas no apartamento da irmã em Praia Grande.
“Vocês sabem o quanto eu amo aquela mulher, [o] quanto sou louco por ela”, disse Igor, de acordo com uma testemunha. “Vocês tudo contra mim, tudo armando contra mim. Eu era o único que não sabia de nada”.
Segundo a denúncia do MP-SP, Igor também demonstrou estar decepcionado com a irmã e o cunhado. “Do que adiantou eu fazer tudo? Eu me esforço tanto, eu fiz isso sempre por todos, seus traíras, p***”, teria dito a vítima antes de ser morta a facadas.
Triângulo amoroso
Casais (Mário e Marcelly, à esq. e Igor e Rafaela, à dir.) moravam próximos em Praia Grande (SP) — Foto: Redes Sociais
O MP-SP concluiu que o trio premeditou o crime porque Igor era um “empecilho no triângulo amoroso” entre Rafaela, Marcelly e Mario Vitorino. Ao g1, a promotora Roberta afirmou ter considerado o caso como “chocante e violento”.
Para a promotora, o trio demonstrou “alta periculosidade” por ter planejado a morte de uma pessoa próxima e por ter feito pesquisas de quanto tempo um corpo demora a feder. “Se eles fazem isso com alguém que juravam amor, o que não fariam com nós, com as demais pessoas que convivem com eles na sociedade?”, afirmou Roberta.
A promotora disse que em nenhum momento os envolvidos tentaram salvar Igor ou minimizar o sofrimento dele. “Fizeram buscas de rota de fuga ou de quanto tempo demoraria para [o corpo] cheirar e chamar a atenção de alguém e eles terem tempo de fugir”, complementou.
Vantagem financeira
Igor Peretto, irmão do vereador de São Vicente (SP), Tiago Peretto (União Brasil), foi morto a facadas em Praia Grande — Foto: Reprodução/Redes Sociais e Thais Rozo/g1
De acordo com a denúncia recebida pela Justiça, a morte de Igor traria “vantagem financeira” aos acusados. Os advogados dos presos negaram a versão apresentada pelo MP-SP, que afirmou que Rafaela mantinha relacionamentos extraconjugais com Mário e Marcelly, estabelecendo uma relação íntima entre o trio sem o conhecimento do comerciante.
O Ministério Público citou quais seriam as vantagens financeiras aos denunciados. Segundo o órgão, Mário poderia assumir a liderança da loja de motos que tinha em sociedade com o cunhado, enquanto a viúva receberia herança. “Marcelly, que se relacionava com os dois beneficiários diretos, igualmente teria os benefícios financeiros”.
O MP considerou a ação do trio contra Igor um “plano mortal”. O documento diz que eles planejaram o crime, sendo que Mário desferiu as facadas, a viúva atraiu o comerciante e, junto com Marcelly, incentivou Mário a matá-lo.
O órgão levou em conta essas informações para elaborar a denúncia por homicídio qualificado. “O crime foi cometido por motivo torpe, pois Mário, Rafaela e Marcelly consideraram Igor um empecilho para os relacionamentos íntimos e sexuais que os três denunciados mantinham entre eles.
Ainda segundo a denúncia, o assassinato também foi praticado mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, pois Igor estava desarmado e foi atacado por uma pessoa com quem tinha relacionamento próximo e de quem não esperava mal.
Sobre o crime
Casais estavam dentro do apartamento onde Igor Peretto foi encontrado morto em Praia Grande (SP) — Foto: Yasmin Braga/g1 e Reprodução/Redes Sociais
O crime aconteceu em 31 de agosto no apartamento da irmã de Igor, em Praia Grande. Dentro do imóvel estavam a vítima, Marcelly e Mário Vitorino. Rafaela chegou com Marcelly ao apartamento, mas o deixou 13 segundos antes do marido chegar com o suspeito pelo assassinato.
De acordo com os depoimentos do trio e dos advogados, a viúva Rafaela tinha um caso com Mário. Além disso, o advogado de Marcelly chegou a dizer que a cliente e Rafaela tiveram um envolvimento amoroso no local antes da chegada de Igor e Mario no apartamento.
Igor Peretto foi morto a facadas e teria ficado tetraplégico [sem movimento do pescoço para baixo] se tivesse sobrevivido. A informação consta em laudo necroscópico obtido. Três pessoas próximas à vítima foram presas: Viúva, irmã e cunhado.
Quadrinhos
Laudo apontou que as versões de Mario Vitorino e Marcelly Peretto são contraditórias entre si — Foto: Laudo pericial
A reconstituição do caso foi registrada pela Polícia Civil em uma história em quadrinhos. De acordo com o laudo da perícia obtido, o cunhado e a irmã da vítima participaram da simulação e apresentaram versões contraditórias.
No documento, o perito criminal explicou que as ilustrações das versões “seguem um padrão similar aos de fotonovelas e de histórias em quadrinhos”. O objetivo foi facilitar a compreensão das cenas apresentadas pelos investigados para uma minuciosa análise das versões.
Além das fotos capturadas durante a reconstituição, de acordo com o laudo, também foram utilizados elementos gráficos e textuais, comuns em histórias em quadrinhos. Entre eles: Quadros de legenda, balões de fala e onomatopeias [figura de linguagem que usa palavras para imitar sons].
Prisões
Mario, Marcelly e Rafaela, investigados pelo homicídio contra o comerciante Igor Peretto — Foto: Reprodução e Redes sociais
As mulheres se entregaram e foram presas em 6 de setembro, enquanto Mário foi detido após ser encontrado escondido na casa de um tio de Rafaela, em Torrinha (SP), no dia 15 do mesmo mês.
O trio havia sido preso temporariamente em setembro e, no início de outubro, a prisão temporária foi prorrogada. Na ocasião, a defesa de Rafaela chegou a entrar com pedido de habeas corpus, que foi negado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Justiça de Praia Grande (SP) converteu as prisões do trio, de temporárias para preventivas, após a denúncia feita pelas promotoras Ana Maria Frigerio Molinari e Roberta Bená Perez Fernandez, do MP-SP.
Reconstituição da morte de Igor Peretto foi registrada em história em quadrinhos — Foto: Laudo pericial
O que se sabe sobre a cronologia do crime até o momento:
04:32:38 – Marcelly e Rafaela chegam de carro ao prédio de Marcelly;
05:40:17 – Rafaela vai embora do apartamento de Marcelly;
05:42:27 – Rafaela deixa o local com o carro;
05:42:40 – Mario e Igor chegam ao prédio de Marcelly;
05:44:40 – Mario e Igor saem do elevador em direção ao apartamento de Marcelly;
06:04:31 – Mario e Marcelly saem do apartamento pelas escadas e acessam o subsolo, logo após o homicídio;
06:05:03 – Mario e Marcelly saem pela rampa do subsolo e vão em direção ao carro dele;
06:05:25 – Mario e Marcelly partem de carro em direção ao apartamento dele;
06:11:29 – Mario e Marcelly chegam ao prédio dele;
06:16:44 – Mario e Marcelly deixam o prédio dele e fogem;
08:48:00 (aproximadamente) – Mario e Marcelly se encontram com Rafaela em um posto na Rodovia Governador Carvalho Pinto, no km 124, em Caçapava (SP), onde a viúva abandonou o carro e embarcou no carro do amante, onde já estava a irmã da vítima;
09:47:42 – Mario, Marcelly e Rafaela chegam em Campos de Jordão (SP), onde a irmã da vítima teria entrado em um carro por aplicativo e retornado para Praia Grande;
12:28:00 – Mario e Rafaela se hospedam em um motel em Pindamonhangaba (SP), onde permanecem até 15h37. No mesmo dia, abandonam o carro dele no Centro da cidade.
Vídeos mostram momentos antes e depois do assassinato de comerciante que descobriu traição
Em acesso às últimas imagens do comerciante com vida. Os vídeos mostram os três suspeitos e a vítima chegando ao apartamento onde ocorreu o crime. Primeiro, chegam Marcelly e Rafaela, mas a viúva deixa o apartamento antes de Mario aparecer com Igor (assista o vídeo acima).
Nas imagens obtidas, é possível ver Rafaela e Marcelly chegando de carro e subindo de elevador até o apartamento da irmã da vítima, por volta das 4h30. A esposa de Igor deixou o local sozinha, cerca de dez minutos depois, antes da chegada dos homens.
Igor e Mario também foram filmados chegando de carro ao prédio, às 5h42. A dupla subiu de elevador aproximadamente dois minutos depois. Na ocasião, o comerciante parecia questionar o cunhado antes de acessar o imóvel da irmã. Este é o último registro dele, feito pelas câmeras de monitoramento.
Mario e Marcelly são casados no papel, mas já não estavam mais juntos. O crime aconteceu no imóvel dela, onde foram filmados saindo às 6h04. O casal desceu pelas escadas, foi até o subsolo e deixou o prédio a pé pela garagem.
De lá, os dois foram de carro para o apartamento de Mário, que fica a poucos quilômetros de distância do local do assassinato. Eles chegam ao prédio às 6h11, ficaram aproximadamente cinco minutos e saíram segurando bolsas e outros objetos.
A Polícia Militar foi acionada pela síndica. Com a ajuda de um chaveiro, solicitado por ela, a porta foi aberta e os agentes notaram sinais de sangue no corredor. Eles encontraram o corpo de Igor caído em um quarto, próximo da janela.