O motorista Patrik do Nascimento Silva, de 44 anos, morreu após fazer uma ressonância na coluna em uma clínica em Santos (SP). A esposa dele entrou na Justiça pedindo indenização por danos morais.
Fabio (à esq.), ressonância magnética (no centro) e Patrick (à dir.) — Foto: Arquivo Pessoal, Mult Imagem e Arquivo Pessoal
A clínica onde o empresário Fábio Mocci, de 44 anos, morreu durante uma ressonância magnética em Santos, no litoral de São Paulo, é alvo de uma ação na Justiça por outra morte relacionada ao exame. O motorista Patrik do Nascimento Silva, também de 44, morreu momentos após passar pelo procedimento em 2021.
Fábio se submeteu ao exame na cabeça na clínica Mult Imagem, no bairro Vila Mathias, no último dia 22. Segundo a viúva, uma médica da unidade disse que ele sofreu um infarto fulminante. Apesar disso, um laudo do Serviço de Verificação de Óbito (SVO) de Santos considerou a “morte suspeita”, solicitando a conclusão do Instituto Médico Legal (IML), que ainda está em andamento.
Patrik do Nascimento Silva, por sua vez, morreu após passar por uma ressonância magnética na coluna, em 2021. A esposa dele, a confeiteira Maria Aparecida Dias de Araújo, de 50, contou que a repercussão da história de Fábio trouxe à tona o que sentiu por conta da morte do marido.
“Foi como se eu tivesse revivido o que aconteceu comigo há três anos”, lamentou ela. “Foram as mesmas circunstâncias”.
Procurada, a clínica Mult Imagem não se manifestou até a publicação desta reportagem.
Patrik do Nascimento Silva, de 44 anos, morreu após exame de ressonância magnética em Santos (SP) — Foto: Arquivo Pessoal
“Saí da minha casa cheia de planos, com meu marido dirigindo, e voltei para casa com meu marido no caixão, sem ter uma explicação do que aconteceu ali naquele dia”, lamentou Maria.
Morte de motorista
O caso ocorreu em 14 de maio de 2021 e foi registrado na Polícia Civil como morte suspeita. Por conta disso, o corpo do motorista foi submetido a exame necroscópico no IML, que apontou as causas como “cardiopatia, edema pulmonar e obesidade”.
A viúva, porém, acredita que houve negligência por parte da Mult Imagem. Segundo ela, Patrik era portador de diabetes e não há indícios de que a clínica tenha realizado os procedimentos necessários antes da sedação. Além disso, ainda de acordo com Maria, foi ela que percebeu que o marido estava passando mal após o exame, acionando a equipe médica.
“Vivo à base de remédio psiquiátrico para poder dormir, para me manter acordada, porque vi meu marido morrer”, desabafou a viúva. “E eles nem tinham percebido que meu marido saiu daquela sala passando mal”.
Maria entrou com um pedido de indenização por danos morais na Justiça no valor de R$ 75 mil. De acordo com o advogado dela, Sérgio Zagarino Junior, o processo teve início em agosto de 2022 e segue em andamento, ou seja, aguardando julgamento. Segundo ele, há um laudo pericial favorável à viúva.
“A avaliação pré-anestésica foi feita no momento do exame e não foram solicitados os exames complementares necessários. Nesse aspecto, o Réu não agiu dentro da boa prática médica, pois deixou de cumprir os deveres de informar adequadamente e de solicitar os exames necessários”, aponta o documento assinado por um médico perito.
“Destruíram a minha família […]. Perdi meu marido, eu perdi meu chão”, desabafou Maria.
Patrik do Nascimento e Maria Aparecida tinham relacionamento há 12 anos — Foto: Arquivo Pessoal
Ressonância na coluna
De acordo com a viúva, um médico solicitou a ressonância magnética da coluna de Patrik após ele apresentar dores no local, em abril de 2021. Como o motorista tinha claustrofobia [medo de estar em ambientes fechados e com pouca circulação de ar], a sedação foi indicada.
Maria enfatizou que o marido passou por exames anteriores com sedação e nunca teve problema. Ele era portador de diabetes e obeso, mas fazia uso de medicação e estava em tratamento, segundo ela.
No dia do exame, a confeiteira acompanhou Patrik até a clínica em Santos. O homem estava em jejum, mas chegou a testar o índice de glicemia antes de sair de casa, em Guarujá (SP). “Estava tudo normal e a gente foi”, relembrou Maria.
Ela disse que esperou junto com ele por um tempo na clínica até ser chamado para assinar a ficha de anamnese [entrevista médica]. Em seguida, Patrik foi chamado para a sala.
“Meu marido tirou aliança, me deu e falou assim: ‘Até daqui a pouco’. [Mas] meu marido não voltou”, lamentou.
Após um tempo sem notícias, a confeiteira perguntou sobre o estado do marido para uma funcionária, que assegurou sobre a realização do exame. “Fiquei esperando, mas aquela demora foi começando a me dar uma angústia, porque estava vendo [que tinha] alguma coisa errada”, disse Maria.
Encontro com marido
Um tempo depois, ela foi chamada para acompanhar o motorista na sala de repouso. No entanto, a confeiteira se surpreendeu com o estado que encontrou o marido.
“Quando cheguei na sala, meu esposo estava com a boca roxa, com os dedos todos roxos. Parecia que ele estava dormindo, mas estava roncando, puxando ar”, descreveu.
A mulher disse ter questionado uma enfermeira se a situação era normal, recebendo como resposta que aquilo era efeito da anestesia, mas que poderia tentar acordá-lo. A confeiteira obedeceu a ordem, mas após dez minutos chamando o homem, perguntou para a profissional se era possível medir a taxa de glicemia, uma vez que ele era diabético.
“Uma moça que estava fazendo o acesso de um rapaz olhou para trás. No que ela olhou, já saiu da sala e voltou com o médico”, relembrou Maria, que logo foi retirada do cômodo.
Durante aproximadamente 40 minutos sem notícias do marido, de acordo com o relato, a confeiteira passou a acionar familiares dizendo que tinha algo errado acontecendo até ser chamada novamente e, desta vez, informada sobre a morte do motorista.
“Eu me desesperei. Tentei sair da sala. Eles me seguraram, me deixaram na sala porque a clínica estava cheia, não me deixaram sair de lá. Acho que eu desmaiei [e], quando eu voltei, depois de um tempo, chegou a equipe do SAMU”.
Segundo a viúva, o médico da clínica queria que o profissional do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) atestasse o óbito, mas ele se recusou. Desta forma, a polícia foi acionada e o caso foi registrado como “morte suspeita” na Central de Polícia Judiciária (CPJ) da cidade.
Falta de assistência
De acordo com a confeiteira, a clínica não tem preparo para realizar este tipo de exame, pois sequer tinha desfibrilador à época. Além disso, a mulher disse não ter sido procurada pela unidade.
“Não prestou nenhum tipo de assistência, nem nada. Fui tratada igual a um cachorro, acho que nem com um bicho se faz o que eles fizeram”, afirmou.
Patrik do Nascimento Silva deixou dois enteados e a esposa — Foto: Arquivo Pessoal
Justiça
A confeiteira mantinha um relacionamento de 12 anos com Patrik, que deixou dois enteados e estava na fila de adoção. “Meu esposo tinha 44 anos, cheios de sonhos e planos”, afirmou a mulher.
“Espero por justiça. Vou ser sincera que na dos homens não confio tanto, mas a de Deus não falha. Que outros Patriks e Fábios não precisem morrer para que seja tomada uma providência”, finalizou.
Morte de Fábio
Fábio Mocci Rodrigues Jardim, morreu aos 42 anos, em Santos (SP) — Foto: Arquivo Pessoal e Mult Imagem
Segundo a esposa da vítima, Sabrina Altenburg Penna, um médico pediu o exame de ressonância magnética na cabeça após Fábio reclamar de sentir “muito sono” durante o dia.
“A gente sempre fez exames de rotina, mas esse em especial foi um pedido do médico”, afirmou a comerciante. De acordo ela, o marido estava “tranquilo” com o procedimento apesar de fazê-lo pela primeira vez.
A comerciante contou que o exame estava marcado para o meio-dia de terça-feira (22). Apesar disso, segundo ela, o marido só foi atendido às 14h. Sabrina disse que o companheiro não reclamou de fome mesmo tendo passado oito horas em jejum. “Demorou muito, atrasou demais. Mas ele estava tranquilo, aguardando”, disse.
Sabrina afirmou ter deixado a clínica para almoçar nos andares inferiores do prédio comercial assim que o marido foi atendido. Ela disse que voltou à unidade em menos de 30 minutos, perguntando a uma das funcionárias se o companheiro estava bem. “Ela disse que sim, que estava fazendo o exame, agitado, normal, mas que estava tudo bem”, lembrou.
Fábio Mocci Rodrigues Jardim deixou duas filhas, de 6 e 14 anos — Foto: Arquivo Pessoal
De acordo com o relato, a comerciante aguardou o fim do exame dentro da clínica. Pouco depois de perguntar sobre o estado do marido, ela percebeu uma “movimentação estranha” de pessoas entrando e saindo do cômodo rapidamente. Sabrina novamente questionou sobre o companheiro.
“[A funcionária] falou: ‘Olha, está tudo bem. Ele passou mal, mas já estamos resolvendo’. E ficou uma moça na porta o tempo inteiro, então sentei e fiquei esperando”, lembrou Sabrina.
Após aproximadamente 40 minutos de “tensão e angústia”, Sabrina viu dois profissionais do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) indo em direção à sala da ressonância. Por isso, ela perguntou mais uma vez sobre o que estava acontecendo.
“Os médicos do Samu abriram a porta para entrar e vi que ele [Fábio] estava deitado e tinha uma pessoa em cima dele fazendo a massagem [cardíaca] com a mão”, relatou a mulher.
A comerciante chegou a ver a blusa do marido ser rasgada para os primeiros socorros, mas logo foi informada sobre a morte dele após infarto fulminante. A mulher disse que a mãe dela e uma amiga chegaram ao local na sequência, assim como a polícia.
“Ficaram lá perto para ouvir o que estava acontecendo. Eu não aguentava, só chorava”, relembrou, acrescentando que precisou ir até a delegacia registrar o caso, enquanto o corpo do marido foi encaminhado ao Serviço de Verificação de Óbito (SVO), que emitiu um laudo sobre morte suspeita.
No documento, foi descrito que o órgão considerou “prudente e necessário o exame necroscópico e toxicológico” realizado por médico legista. “Por exposição a outras drogas, medicamentos e substâncias biológicas, não especificadas, intenção não determinada – residência”.